Agentes de Trânsito: Conforme parecer jurídico, Projeto de Lei não foi votado em plenário, e, por isso, não está rejeitado

Uma reviravolta pode ocorrer quanto ao futuro do Projeto de Lei que cria os cargos de Agentes Fiscais de Trânsito no município. Após ser declarado rejeitado em Sessão Ordinária pelo presidente da Câmara após a votação favorável de parecer da Comissão de Infraestrutura, uma análise jurídica do fato pode colocar o projeto novamente em pauta nesta segunda-feira.

Após o episódio que repercutiu com a rejeição do projeto e a impossibilidade da Prefeitura cumprir com sua obrigação contratual com a concessionária dos serviços de exploração do estacionamento rotativo, foi levantada a hipótese do Projeto de Lei rejeitado retornar à Casa a partir de pedido feito pela maioria absoluta dos vereadores do Legislativo, o que foi tema inclusive de ofício encaminhado à Prefeitura pela empresa se comprometendo a efetuar de imediato algumas melhorias no serviço prestado como forma de modificar posições de vereadores contrários ao projeto. No entanto, um parecer jurídico solicitado pelo Presidente da Câmara versa sobre uma situação adversa a esta.

Em conformidade com o parecer, a votação que ocorrera foi pela aprovação ou desaprovação do parecer da Comissão de Infraestrutura, a qual não teria poder deliberativo mas, sim, de opinar sobre respectiva matéria. Assim, pelo fato do Projeto de Lei ser rejeitado sem ter sido colocado em votação, a conclusão jurídica do consultor responsável pelo parecer é de que o processo legislativo ficou inconcluso, devendo o mesmo ser concluído com a deliberação do mérito do Projeto de Lei pelo Plenário da Câmara Municipal, ou seja: que o Projeto de Lei que cria os cargos de Agentes Fiscais de Trânsito seja votado em plenário, o que não teria ocorrido anteriormente. Da mesma forma, recomenda a retificação da ata da respectiva reunião ordinária. A seguir, segue o parecer confeccionado pelo IGAM, órgão que presta orientação técnica e jurídica ao Legislativo são-luizense:

IGAM

Porto Alegre, 09 de abril de 2019.

Orientação Técnica IGAM no 15.289/2019.

  1. O Poder Legislativo do Município de São Luiz Gonzaga, através de consulta enviada ao IGAM por Guilherme, solicita orientação acerca da questão a seguir colocada, nas mesmas letras:

Boa tarde!

Determinado Projeto de Lei, de iniciativa do Executivo Municipal, chegou em nossa Câmara e, quando posto em discussão no Plenário, baixou para Comissão Permanente de Infraestrutura para estudo. Referida Comissão emitiu PARECER opinando pela rejeição, naquele momento, do Projeto de Lei em questão. O Parecer emitido pela Comissão foi posto em votação no Plenário, sendo este aprovado por maioria. Na Ata da Sessão constou que o Parecer foi aprovado por maioria, bem como que o Projeto de Lei também fora rejeitado por maioria. O Presidente, após a votação do Parecer, referiu que o Parecer foi aprovado por maioria e que o Projeto de Lei foi, consequentemente, rejeitado. Ocorre que O PROJETO DE LEI NÃO FOI POSTO EM VOTAÇÃO EM MOMENTO ALGUM, uma vez que só foi votado o Parecer da Comissão de Infraestrutura, que não passa de um estudo para embasar o voto do Projeto em si, correto? Então lhes pergunto, o Processo Legislativo, referente ao Projeto de Lei, não teve fim? O correto seria retificar a ata para constar somente o que foi, de fato, votado, conforme Sessão Ordinária e, daí sim, colocar em discussão e votação o Projeto de Lei? Frisamos que a Sessão foi gravada, e o áudio da gravação corrobora com este sucinto relatório. Desde logo, agradecemos a atenção.

Guilherme Dornelles Chagas – Assessor Jurídico da Câmara Municipal de São Luiz Gonzaga.

  1. Inicialmente, importa registrar que o processo legislativo é a sucessão ordenada de atos que se apresentam de forma determinada, onde se busca a elaboração de leis, decretos legislativos ou resoluções. Tem por objeto a formação de atos normativos.

Cada uma das fases tem seu procedimento próprio, sua tramitação. O que importa aos legisladores é respeitar esse mecanismo de formação normativa, para que a lei não seja corrompida em sua fase de formação.

O processo legislativo, porque é instrumento de afirmação do Estado Democrático de Direito, não está disponível para exceções casuísticas ou circunstanciais. Suas regras processuais constituem-se em condição para a legitimação das normas jurídicas produzidas em quaisquer níveis da Federação.

A respeito do tema, ensina o Desembargador Vasco Della Giustina (in Leis Municipais e seu controle constitucional pelo Tribunal de Justiça. Porto Alegre. Livraria do Advogado.

Págs. 77-78), “A lei não é um produto pronto. Sofre ela uma elaboração, que se concretiza aos poucos, e por etapas, até seu acabamento final. A isto se denomina processo legislativo. É ele, pois, uma sucessão de atos que, interligados e obedecendo a diretrizes legais, produz as normas de Direito.”

O processo legislativo, portanto, é o conjunto de disposições que disciplinam o procedimento a ser observado pelos órgãos competentes na elaboração das espécies normativas, podendo a não obediência às disposições sobre o processo legislativo, regimentalmente previstas, acarretar a ilegalidade do ato.

Nesse contexto, possível afirmar, consoante a lição de André Leandro Barbi de Souza1 que “a elaboração de uma lei pressupõe a realização de atos a serem cumpridos em cinco fases distintas que, em conjunto, formam o quadro de procedimentos a ser observado para que o processo legislativo seja corretamente atendido (devido processo legislativo). As fases são: iniciativa instrução, deliberação, revisão e executiva”

  • Especificamente no que respeita a questão trazida a deslinde, cumpre observar que, consoante a lição do autor antes citado, a fase de instrução do processo legislativo “desenvolve-se nas comissões de natureza temática e tem, como finalidade, produzir informações e documentos e gerar conhecimento técnico e político que complementem e qualifiquem o projeto de lei, a partir da respectiva área de atuação, com o propósito de melhor orientar a decisão dos parlamentares, quando da deliberação plenária da matéria2.”

Ainda segundo o mesmo autor3, “o papel das comissões não é deliberar, mas instruir as matérias sob a apreciação do Poder Legislativo Municipal. Essa é a razão pela qual a manifestação das comissões é de natureza opinativa, sob o formato de parecer”.

Nesse contexto, com exceção do parecer da Comissão de Constituição e Justiça que conclua pela inconstitucionalidade do projeto examinado, não há se falar em deliberação de parecer de comissão permanente pelo Plenário da Câmara Municipal, muito menos em rejeição de projeto decorrente de aprovação de parecer de comissão permanente.

Nesse sentido, aliás, cumpre salientar que o artigo 139, do Regimento Interno da Câmara Municipal de São Luiz Gonzaga, ao tratar da ordem de votação das matérias submetidas a deliberação do Plenário, em momento algum, e não poderia ser diferente, refere a votação de parecer de comissão permanente.

Com efeito, a rejeição ou aprovação de um projeto de lei só pode decorrer da deliberação do mérito da proposição pelo Plenário da Casa, na fase deliberativa do processo legislativo, uma vez que é este o órgão legislativo soberano da Câmara Municipal.

Dessa forma, se, no caso concreto, o mérito do projeto de lei não foi submetido a deliberação do Plenário, tem-se que o processo legislativo está inconcluso, impondo-se seja o mérito da proposição submetido a deliberação do Plenário.

Para tanto, se constou da ata da sessão plenária em que, equivocadamente, foi submetido a deliberação do Plenário o parecer da Comissão de Infraestrutura que o projeto de lei em comento foi rejeitado, deverá a ata ser retificada, a fim de fazer constar que o que foi deliberado pelo Plenário foi apenas o parecer da Comissão Permanente, para, na sequência, determinar-se a inclusão da matéria na ordem do dia da sessão subsequente, para deliberação de mérito.

 

  1. Dito isso, em conclusão, orienta-se no sentido de que a rejeição de um projeto de lei só poderá decorrer da deliberação de seu mérito pelo Plenário da Câmara, não havendo se falar em rejeição da matéria em decorrência de aprovação de parecer de Comissão Permanente.

 

Orienta-se, ainda, no sentido de que, caso o mérito da proposição não tenha sido deliberado, o processo legislativo está inconcluso, devendo o processo ser concluído, com a deliberação do mérito do projeto de lei pelo Plenário da Câmara Municipal.

O IGAM permanece à disposição.

EVERTON M. PAIM

OAB/RS 31.446

Consultor do IGAM

Fonte: Emerson Scheis/Rádio São Luiz