UNIPAMPA celebra legado artístico e histórico de Jayme Caetano Braun, Noel Guarany, Cenair Maicá e Pedro Ortaça

Foto: Luiz Oneide Nonemacher

A Universidade Federal do Pampa (Unipampa) realizou na tarde de 24 de outubro de 2025 a 69ª Sessão Extraordinária do Conselho Universitário (Consune), destinada à concessão do título de Doutor Honoris Causa aos quatro troncos missioneiros — Jayme Caetano Braun, Noel Guarany, Cenair Maicá e Pedro Ortaça. A cerimônia, realizada em São Luiz Gonzaga/RS, marcou o reconhecimento institucional da universidade ao legado cultural, histórico e artístico dos artistas da música missioneira.

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A sessão iniciou com a apresentação do Grupo Folclórico Fênix, de São Luiz Gonzaga, que apresentou o espetáculo “Missões – A Saga Jesuítico-Guarani”, coreografia dos irmãos Bassani. A encenação representou o encontro entre as culturas guarani e jesuítica e a formação do povo missioneiro, ressaltando o papel da arte e da música na preservação da identidade regional.

O discurso de fundamentação foi proferido pelo professor Augusto Gonzaga de Freitas, do Campus Itaqui, autor da proposição aprovada por unanimidade pelo Conselho Universitário. Em sua exposição, ele abordou o contexto histórico das reduções jesuítico-guaranis, desde a fundação de São Nicolau, em 1626, até a Guerra Guaranítica, e destacou que a arte e a cultura foram elementos determinantes para a sobrevivência da memória coletiva missioneira. Segundo ele, “a cultura não é um adorno; ela é a fundação onde a memória histórica se constrói e a bússola que orienta o futuro”.

O docente detalhou o papel de cada homenageado na consolidação da música missioneira. Jayme Caetano Braun foi citado como o mestre do verso campeiro e o principal responsável pela difusão da pajada no Rio Grande do Sul. Noel Guarany, descrito como o trovador das fronteiras, reuniu em sua trajetória influências argentinas, paraguaias e uruguaias, transformando o idioma guarani e as melodias regionais em símbolos da identidade missioneira. Cenair Maicá foi lembrado como o cantor das águas, cuja obra abordou temas ambientais e a espiritualidade do homem do campo. Já Pedro Ortaça, único dos quatro artistas ainda vivo, foi reconhecido por dedicar sua vida à preservação da música missioneira e à valorização das origens indígenas e camponesas da região.

O professor destacou que “os quatro troncos missioneiros criaram uma identidade musical única, que une a melodia ancestral guarani ao ritmo campeiro e ao lirismo social, tornando-se cronistas sonoros do imaginário missioneiro”. Afirmou ainda que a homenagem representa “a interseção entre a arte e a academia, o saber popular e o saber científico, a voz do povo e a voz da universidade”.

Após a leitura da fundamentação, o Reitor da Unipampa Edward Pessano conduziu o ato de concessão dos títulos, iniciando com a entrega ao músico Pedro Ortaça. O reitor explicou o simbolismo das vestes acadêmicas — a beca, a samarra e a borla — como representações da humildade, da dignidade e da sabedoria. Declarou oficialmente: “Concedo a Pedro Ortaça o título e grau de Doutor Honoris Causa da Universidade Federal do Pampa, podendo o agraciado fazer todos os usos e prerrogativas inerentes a esse título e grau, em nome da comunidade acadêmica da Unipampa”.

Em pronunciamento, Pedro Ortaça agradeceu à universidade e relembrou a trajetória dos troncos missioneiros: “A caminhada foi longa. Lutamos para que a nossa música e a nossa história fossem reconhecidas. Hoje vejo que valeu a pena, porque a cantiga missioneira segue viva e será levada pelas novas gerações.” O músico ressaltou que o título representa o reconhecimento da cultura missioneira como parte integrante da história gaúcha. Acompanhado do filho Gabriel Ortaça, apresentou uma canção de Aparício Silva Rillo em homenagem ao Rio Grande do Sul e ao povo missioneiro.

As demais homenagens in memoriam foram entregues aos representantes das famílias. Patrício Maicá, representando Jayme Caetano Braun, utilizou versos do próprio pajador ao agradecer: “Os quatro troncos missioneiros nasceram do mesmo abraço, sentados nos mesmos laços, presos nos mesmos preceitos.”

Laura Guarany, filha de Noel Guarany, enfatizou o tempo de dedicação e a importância do reconhecimento: “Foram 56 anos de vida e de luta para que a obra do meu pai e dos troncos missioneiros fosse reconhecida como identidade da nossa região. Tenho certeza de que onde estão, Noel, Jayme e Cenair estão orgulhosos, porque esta homenagem confirma o valor da cultura missioneira como expressão do nosso povo.”

Miguel Maicá, filho de Cenair Maicá, destacou o legado deixado por seu pai e pelos demais: “Eles defenderam nossa terra com o canto e a poesia, com o mesmo orgulho e coragem de quem empunhou a lança. Cantaram a natureza, os rios, a verdade do nosso povo. Essa é a maior riqueza que nos deixaram.”

Durante as manifestações institucionais, o diretor do Campus Itaqui, José Carlos Severo Corrêa, destacou que o reconhecimento da Unipampa simboliza o compromisso da universidade com o saber popular e com a cultura regional. O vice-prefeito de Itaqui, Clóvis Antônio Ravarotto Corrêa, afirmou que a solenidade representa “a própria alma do Rio Grande, pois o saber não mora apenas nos livros, mas também nas canções e na sabedoria do povo”.

O prefeito de São Luiz Gonzaga, José Antônio Flach Werle (Piti Werle), destacou a relevância da homenagem para o município e citou a milonga Está na Hora, composta por Jayme Caetano Braun e Pedro Ortaça, como exemplo da consciência e da força cultural missioneira: “Pedro representa o elo entre o passado e o presente. Ele é a voz viva da nossa história. Em cada acorde, em cada verso, está a alma de São Luiz Gonzaga e das Missões.”

O Reitor da Unipampa Edward Pessano ressaltou que a homenagem transcende protocolos acadêmicos: “A Unipampa reconhece nesses quatro artistas não apenas a arte, mas o conhecimento, o ensino e a resistência cultural. A universidade pública se ajoelha diante da grandeza da cultura popular e se levanta para dizer: doutores, sim; mestres, sim; patrimônio vivo, sim.”

A cerimônia foi finalizada com a execução do Hino Rio-Grandense, interpretado por Gabriel Ortaça, seguido às apresentações culturais no CTG Galpão de Estância.

Fonte: Rádio São Luiz