Estacionamento Rotativo: Advogado são-luizense emite parecer alertando sobre as consequências administrativas e jurídicas da rejeição do Projeto de Lei que cria o cargo de Agente Fiscal de Trânsito

Em meio ao debate levantado após a rejeição do Projeto de Lei que cria o cargo de Agente Fiscal de Trânsito em São Luiz Gonzaga pela Câmara de Vereadores, a 1ª Secretária da Casa, vereadora Ana Brum de Barros (PT), solicitou parecer jurídico sobre o caso ao advogado são-luizense Flávio José Bettanin, notório profissional que atuou muitos anos na área do Direito no município e que também teve atuação destacada na política local, vindo a ser vereador na década de 1970 e presidido a Câmara de Vereadores durante seu mandato, à época, pelo MDB.

O parecer solicitado teve o objetivo de esclarecer dúvidas da edil solicitante quanto às possíveis consequências da rejeição da referida matéria pelo Legislativo, uma vez que, conforme o contrato firmado entre o Município e a empresa concessionária do serviço de exploração do estacionamento rotativo na cidade, a operacionalidade dos serviços tem como condição necessária a existência de  agente público, cujo cargo lhe atribua  a fiscalização,  incluindo  nas atribuições, a de notificar e  autuar infratores. A criação deste cargo, que seria de incumbência do Poder Executivo, foi o objeto do Projeto de Lei rejeitado.

Após a rejeição do projeto e de manifestação da empresa concessionária, a qual se comprometeu com a efetuação de melhorias solicitadas pela Comissão de Infraestrutura da Câmara que emitiu o parecer desfavorável à aprovação, a Mesa Diretora reuniu-se nesta semana com os demais edis para apresentar a proposta da empresa e informar sobre a existência de requerimento para o pedido de reenvio do Projeto de Lei à Casa novamente, o qual necessitaria da assinatura de nove vereadores favoráveis pelo encaminhamento da matéria pelo Executivo.

A seguir, o teor do parecer solicitado pela vereadora Ana Barros ao advogado Flávio Bettanin, o qual foi encaminhado à imprensa no dia de hoje:

PARECER SOBRE CONSEQUÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E JURÍDICAS DA REJEIÇÃO DO PROJETO DE LEI 004/2019 DO PODER EXECUTIVO

“Solicita-me parecer a Vereadora Ana Brum de Barros sobre as consequências administrativas e jurídicas da rejeição, pela Câmara, do projeto de lei que dispõe sobre a criação de cargos de Agente Fiscal de Transito. Agradecendo a deferência da solicitação, opino, não na condição de operador de Direito, vez que estou afastado da advocacia há mais de cinco anos, mas como cidadão interessado, usuário do estacionamento rotativo.

A matéria leva ao exame da legislação pertinente e documentos. A competência para a instituição do serviço é prevista na Lei Maior. A Constituição, pelo inciso V, do art. 30, dá competência aos Municípios para organizar e prestar diretamente ou sob regime de concessão ou permissão os serviços públicos de interesse local. Foi assim que o Município de São Luiz Gonzaga, com o permissivo constitucional, observando a legislação infraconstitucional e ordinária, instituiu o Estacionamento Rotativo Pago. A Lei Municipal 5.527/15 está sintetizada na ementa: ‘Institui o Estacionamento Rotativo Pago em vias públicas da cidade de São Luiz Gonzaga e dá outras providências’.

Pela referida Lei, o Município, conforme o artigo primeiro, adotou o regime de concessão. Faz detalhamento das áreas da cidade onde se efetivará o serviço, os dias da semana e o horário diário. A alteração da área exigirá aprovação da Câmara de Vereadores.

Com vista no objeto da consulta, é de registrar o que contém o § 7º, do art. 1º: ‘Em caso de constatação de falta de pagamento ou de exceder ao tempo de 120 minutos estacionado  na mesma vaga, conforme art. 2º desta lei , o condutor será autuado pela infração sendo emitido o Auto de Infração – AIT pelo Agente Municipal  de Trânsito ou pela Brigada Militar, conforme convênio’.

Entre outros comandos, a Lei dispõe sobre o tempo de uso dos usuários das vagas de estacionamento e o valor que o concessionário repassará ao Município.  Ainda, que o controle da execução dos serviços será de responsabilidade (sic) da Secretaria Municipal da Administração, através do Departamento Municipal de Trânsito.

Para a efetivação dos serviços através do regime de concessão, o Poder Executivo emitiu Edital de Concorrência Pública, tendo se credenciado e obtido adjudicação a empresa BR-TIC INOVAÇÕES TECNOLÓGICA LTDA – ME.

É de se observar logo que, na Concorrência e no consequente Contrato, o  Concedente  e o Concessionário, tinham  conhecimento que a operacionalidade dos serviços têm como condição necessária a existência de  agente público, cujo cargo lhe atribua  a fiscalização,  incluindo  nas atribuições, a de notificar e  autuar infratores.

As infrações cometidas por usuários que afrontam as normas do Estacionamento Rotativo Pago constituem ilícitos que se incluem nas previsões do Código Nacional do Trânsito. Exigem, conforme esse estatuo, agente público para notificar e lavrar auto de infração.

Como já foi referido, a Lei que instituiu o ERP, 5.527/15, aponta que a constatação da infração implicará em lavratura de auto de Infração pelo Agente Municipal ou pela Brigada Militar mediante convênio. Sabido que convênio não houve. Já também sabido que no quadro de Cargos e Funções Públicas do Município, não existiam e não existem cargos que tenham as atribuições específicas de notificar e autuar por infração de trânsito.

A Lei que instituiu o ERP é de 2015. O contrato de concessão é de 20 de fevereiro de 2017. Sei, porque inúmeras vezes paguei aos ‘amarelinhos’, que os serviços passaram a ser executados. Mas, é de se indagar, como foram operacionalizados sem a peça chave, o Agente Fiscal  de Trânsito? Como foram contabilizados e recepcionada a quota cabível ao Município?

Não é pois de estranhar que os serviços se desestruturaram e a empresa concessionária passou a acusar resultados deficitários. Ante tal situação, o Poder Executivo do Município, dando-se conta da omissão, da ausência de ato administrativo que deveria ser editado em concomitância com a Lei que instituiu o ERP, da criação do cargo,  enviou à Câmara o  Projeto de lei 004/19, que cria dois cargos de Agente Fiscal de Trânsito.

Disse a omissão do Poder Executivo, mas há de se acrescentar também do Poder Legislativo, pois o projeto de lei que visava instituir o ERP passou pelo crivo do legislativo, fato que, sendo ele parte integrante do poder concedente, assumira, na faixa de poder que lhe compete, o dever de instituir o cargo de agente público, seja com o nome de Agente Municipal ou Agente Fiscal. Mas inevitável que se diga, ante o fato omisso, fonte do descalabro dos serviços, é registrável a patética contemplação da Concessionária, que tem sede na distante e bela praia de Boa Viagem, Recife, Pernambuco.

O projeto foi à Comissão Permanente de Infraestrutura, que, conforme atas, empreendeu exame dos trabalhos desenvolvidos pela Concessionária e questões objetivas, como a metragem do estacionamento e outros, concluindo pelo parecer desfavorável ‘devido ao estacionamento rotativo estar em processo de consolidação’. O projeto foi ao plenário e o parecer aprovado por maioria, dissentindo três vereadores, entre os quais a vereadora consulente.

Pedindo vênia e com o máximo respeito aos componentes da Comissão Permanente de Infraestrutura, e aos vereadores que aprovaram o parecer, afirmo que cometeram grave erro, pois, afastando-se do objetivo do  projeto de  criação do Cargo Público  para o qual o Legislativo se comprometera ao aprovar a instituição do ERP,  puseram o erário público do Município em risco, por descumprimento de condição necessária, para a execução dos serviços contratados. Os riscos das incidências contidas na Cláusula Décima do contrato de concessão.

As condições referidas pela Comissão Permanente, dimensão de vagas, adoção de instrumentos e outras, todas elas, conforme a lei que instituiu a ERP e as cláusula do contrato de concessão, são todas direitos unilaterais do Poder Concedente. Leia-se no contrato os direitos do Concedente, de modo especial os contidos nos itens 4.4  da Cláusula Quarta e ítens 7.5.1.1 e seguintes da Cláusula Sétima. O que postula a Comissão Permanente tem que ser obtido no próprio âmbito do Poder Concedente, através de proposições, decretos ou mesmo leis complementares, condicionar o cumprimento de obrigação do próprio poder é se autoflagelar, ganhando, pelas incongruências, foro de teratologia.

Apresenta-se situação que, pela clareza, os próprios autores do equívoco devem ter se dado conta. Pelas consequências exige urgente correção. Trata-se de projeto de lei rejeitado. O princípio geral é da irrepetibilidade na mesma sessão legislativa de projeto rejeitado.  A Lei Orgânica do Município não traz clareza neste particular sobre o processo legislativo. Entretanto, auscultando a Constituição Federal, diferentemente das constituições anteriores, a de 1988, excepcionou o princípio geral da irrepetibilidade.

Art. 67. A matéria constante de projeto de lei rejeitado somente poderá constituir objeto de novo projeto, na mesma sessão legislativa, mediante proposta da maioria absoluta dos membros de qualquer das Casas do Congresso Nacional.

O comando da Carta Constitucional prevalece sobre as leis federais, estaduais e municipais. Logo, a exceção  contida no art. 67 da CF deve ser adotada no processo legislativo do Município de São Luiz Gonzaga.

Assim entendo que a Câmara de Vereadores poderá sanar  o equívoco  da rejeição do projeto 004/2019, mediante proposição da maioria absoluta de seus membros.

É o parecer que emito, com ressalva de melhor juízo, em atendimento à solicitação da vereadora Ana Brum de Barros, o que faço como opinião de usuário que me é facultada pela Cláusula Oitava do Contrato de Concessão dos Serviços do Estacionamento Rotativo Pago. São Luiz Gonzaga, 4 de abril de 2019. Flavio José Bettanin”

Fonte: Rádio São Luiz